Núcleo de Dança Contemporânea - NUDAC

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Edição de 00h47min de 8 de julho de 2011

De todos os grupos surgidos dentro da Universidade do Amazonas, o Nudac é até hoje o de maior duração: 15 anos. Levando-se em conta a inexistência de uma faculdade de Artes Cênicas ou mesmo de um curso de graduação de Educação Artística, a história de sua criação é sui generis dentro da instituição. O mérito da criação do grupo, em outubro de 1982, deve-se especialmente aos esforços de Nivaldo Santiago, que aquela época estava a frente da direção do Conservatório de Música Joaquim Franco, atuando também como regente do Coral Universitário e professor de música.


O maestro pretendia ampliar as atividades do conservatório, cujo trabalho até aquele momento estava centrado no ensino de música e canto. Portanto, como diretor daquele centro, convenceu o então reitor Otávio Hamilton Botelho Mourão, que ocupou o cargo de 1977 a 1981 e cumpriu, ainda, um segundo mandato, incompleto, de 1981 a 1984, da necessidade da criação do cargo de professora de dança. Desta forma, surgiu o primeiro grupo de dança da Universidade do Amazonas, tendo a frente dos trabalhos a coreógrafa baiana Lia Sampaio, discípula do bailarino norte-americano Clyde Morgan e seguidora das teorias educacionais de Rudolf Von Laban e das idéias difundidas por Isadora Duncan, Martha Graham e Merce Cunningham, entre outros defensores da dança moderna.


Essa identificação artística com os revolucionários da dança resultou em uma metodologia libertária que, segundo a diretora do grupo, não impunha nenhum sistema preestabelecido ou inflexível de dança. Portanto, uma de suas prerrogativas era fornecer total liberdade aos seus integrantes para que eles próprios elaborassem o seu modo de dançar, obtido, na maioria das vezes, de experiências de ‘laboratórios teatrais’ e das vivências emocionais de cada bailarino. À Lia Sampaio cabia o papel de catalisadora destas experiências, posteriormente transformadas em coreografias. Desta forma, Lia Sampaio iria cunhar, em pouco tempo de atividade, a marca com que o Nudac ficaria conhecido: o envolvimento com a cultura brasileira, sobretudo a regional privilegiando em seu repertório a expressão corporal associada ao teatro e, em alguns espetáculos, à cultura afro-brasileira.


É interessante observar que, apesar de ter sido criado em outubro de 1982, as atividades do Nudac só iniciaram oficialmente em janeiro do ano seguinte, quando a Universidade do Amazonas ofereceu instalações para que fosse desenvolvida a prática da dança para a comunidade universitária e para a comunidade em geral, atingindo, desta forma, uma expressiva clientela formada por crianças, adolescentes e adultos. A grande demanda pelas atividades do Nudac forçaram a sua diretora a fazer uma triagem entre os mais de cem inscritos para chegar aos quinze integrantes oficiais. Apesar disto, em algumas ocasiões, o grupo chegou a encenar espetáculos tendo até trinta e dois dançarinos.


Assim, o Nudac se diferenciava, em metodologia e em número de integrantes, dos outros grupos de dança locais, os quais sempre encontraram dificuldades para encontrar quem quisesse levar a profissão de bailarino a serio. Parte desse desinteresse era proveniente do fato de haver pouca, ou quase nenhuma disposição dos iniciantes em dança em enfrentar anos de treinamento rígido. Percebendo que toda aquela clientela desejava realizar o sonho de um dia dançar, Lia Sampaio driblou esta dificuldade oferecendo aos seus discípulos um caminho alternativo para o palco, sem que eles tivessem de passar pela disciplina “militar” do balé clássico.


A estréia do grupo com o espetáculo Corpo e Movimento, em 23 de novembro de 1983, no Teatro Amazonas, ratificou a aceitação da metodologia adotada: cerca de 60 participantes de todas as idades em um encontro marcado pela música e dança e, sobretudo, pelo prazer. Posteriormente, Lia Sampaio ampliaria sua metodologia, utilizando uma abordagem que estimulava a reflexão interior. Com as crianças, entre outras coisas, pedia-se movimentos de bichos e sons de trens. Experiências lúdicas também tinham vez com os adolescentes e adultos, entretanto, o grau de liberdade de criação era maior.


Essa metodologia iria dar origem a uma experiência intitulada como Dança Juventude, o braço direito do Nudac, formado por dezenas de crianças e adolescentes, que durante anos seguidos marcou presença nos espetáculos dirigidos por Lia Sampaio e cujo nome influenciaria futuramente a bailarina Ana Mendes a criar outro grupo de dança no Centro de Artes. As aparições do Dança Juventude revelavam, em parte, a didática da coreógrafa: estimular a criatividade e, ao mesmo tempo, motivar a psicomotricidade.


Por muito tempo esta foi a base de inspiração da coreógrafa, como confirma Horas de Estudo(1985), um trabalho com formas, fruto das descobertas espontâneas individuais dos dançarinos nas atividades grupais ministradas por Lia Sampaio. Mas houve momentos onde a fonte de inspiração foi outra, como Viração (1993), espetáculo criado logo após a leitura de Fundação de Manaus, do historiador amazonense Mario Ypiranga Monteiro.


O pioneirismo do Nudac não se limitou em dar início à geração de companhia artísticas que surgiriam posteriormente na instituição. Ele também foi o primeiro grupo a representar o Amazonas internacionalmente, participando por oito vezes consecutivas do Festival de La Confraternidad Amazonica, em Letícia, Colômbia, e também em um evento promovido pela embaixada brasileira em Bogotá, que estava estabelecendo um programa de intercâmbio artístico-cultural. Ao Nudac também coube o mérito de ser o primeiro grupo institucionalizado pela Universidade do Amazonas.


O Nudac inaugurou a fase de parcerias entre os artistas locais, trabalhando com diversos grupos, especialmente o Coral Universitário e o Madrigal Santiago, cujos cantores se misturavam aos bailarinos nos espetáculos Festa de Brasil Mestiço(1988), Villa Lobos em Cantos do Brasil (1984), Auto de Natal(1985), Corpo e Alma(1990) e Cantos e Passos da Paixão(1988). Trabalhou ainda com o Grupo de Capoeira Mar Azul, o grupo musical Raízes Caboclas e o grupo de percussão Kedakouro, entre outros.


As atividades do Nudac não se limitavam à montagem de espetáculos. Através do Setor de Artes, o grupo incentivou o intercâmbio entre profissionais baianos e amazonenses, trazendo os coreógrafos Edva Barreto e Clyde Morgan para ministrarem cursos de dança moderna para os bailarinos da cidade. O saldo do investimento foi revertido em dois espetáculos: Casa de Bambas(1986), de Edva Barreto e Sankofa(1991), de Clyde Morgan, que reuniu integrantes do Grupo de Teatro e Dança Jurupari, Ballet da Cidade, Grupo Origem, Gedam, Renascença e Gedef.


A expressiva participação do Nudac no âmbito acadêmico e o seu crescente engajamento nos eventos sociais e políticos promovidos pela Universidade Federal do Amazonas acabou fortalecendo a necessidade de reestruturação do Setor de Artes, transformado posteriormente em Centro de Artes, e até a própria criação do Curso de Educação Artística. Ironicamente, todo esse passado não foi levado em conta quando o grupo foi praticamente destruído pela mesma portaria que o criou. Resistindo bravamente à ingratidão, Francisco Assis lutou por pouco mais de um ano pela sua sobrevivência dentro dos muros da Universidade do Amazonas, mas acabou vencido pela insensibilidade administrativa, que pôs um ponto final na trajetória do grupo.


Entretanto, o Nudac sobrevive sob a forma de matriz para muitos de seus ex-integrantes, que ampliaram as experiências iniciadas no extinto grupo, abrindo portas para uma outra geração, tais como Chang Yen Yin, fundadora do Gedef; Jorge Kennedy, criador do Renascença, Cia de Dança do SESC e Cia de Dança Allegro; Francisco Assis, atualmente desenvolvendo trabalhos relacionados à escola de samba; Ítala Clay, que se tornou doutora em Semiótica da Dança e pesquisadora do Instituto Itaú Cultural; Luís Ferreira, que, após um breve período de estudos nas academias do Ballet Stagium em São Paulo, retornou a Manaus para dedicar-se ao seu Marilde’s Ateliê, especializado na confecção de roupas para espetáculos de dança.


Apesar de ainda nutrirem uma paixão ardente pela dança, outros ex-integrantes optaram por seguir carreiras distantes do mundo dos espetáculos: Andréa Arruda tornou-se jornalista, Carla mudou-se para São Paulo para cursar mestrado em comunicação, e Norma Dixo e Rachel Simplício transferiram-se para o Rio de Janeiro.


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