Flávio Sampaio

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O bailarino carrega em seu currículo a experiência de anos de palco, passando pela Escola do Balé Bolshoi em Joinville (SC), além de Munique, Varsóvia e o Teatro Municipal do Rio de Janeiro, onde se aposentou em 1999, depois de detectar uma grave hérnia de disco. Mas é em Paracuru, cidade litorânea, onde ele tem executado seu mais grandioso trabalho, dirigindo há mais de dez anos uma companhia de dança clássica voltada às crianças e jovens da cidade, grande parte de origem humilde. Ele é um cearense às avessas. Um anti-Moacir. Um tanto índio, como o rebento de Iracema, o menino de Paracuru, atrevido, ousou contrariar a narrativa fundada por aquele cearense inaugural. Primeiro artista local a seguir carreira no circuito nacional e internacional da dança, o bailarino Flávio Sampaio, 55, não pestanejou na hora de voltar para casa. Com trajetória consolidada, mâitre de balé reconhecido pelos mais importantes corpos de baile, professor da única sede do tradicional Balé Bolshoi fora da Rússia, Flávio Sampaio criou, já há 10 anos, a Companhia de Dança de Paracuru. Da experiência, inédita no Interior do Estado, brotaram a Escola de Dança, em 2003, e o Festival do Litoral Oeste, três anos depois. Egresso do projeto pioneiro do Serviço Social da Indústria (Sesi), que implantou na Barra do Ceará uma escola de balé capitaneada por dois dos principais nomes da dança clássica brasileira de então, Flávio Sampaio driblou a origem humilde, sendo um dos mais expressivos destaques da geração que ali nascia. Era 1973, quando Fortaleza se viu surpreendida pela chegada do referencial Dennis Gray, titular do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, escolhido para conduzir aquela atividade formativa. A grande novidade é que a iniciativa tinha como foco os segmentos populares da cidade. Mais especificamente: os filhos dos operários.

Ao romper a fronteira das elites, a dança fez do Ceará um terreno dos mais férteis em todo o País. Da Escola do Sesi, saíram alguns dos expoentes da dança brasileira. Além de Sampaio, que, como ele lembra na entrevista a seguir, cavou na marra uma vaga no projeto, já que os pais não eram trabalhadores da indústria, saíram da Barra do Ceará toda a talentosa família Timbó e o inesquecível Fernando Mendes (1962-1992), apontado como o mais perfeito Romeu, na história dos balés de repertório. Nas muitas lembranças de Flávio Sampaio, essa história segue viva e cotidiana. Flávio Sampaio nasceu para dançar. Mesmo que em Paracuru, na infância, não houvesse um professor de forró que fosse. Mesmo que a família o mandasse para o Colégio Militar, em Fortaleza. O que poderia afastá-lo do sonho foi justamente o que lhe deu a oportunidade de vivê-lo. “Passei os anos de Colégio Militar fazendo cursos de teatro, cinema e dança, escondido da família. Procurei me engajar no mundo artístico. Assisti a Hair, a montagem clássica com a Sônia Braga. Esse contato direto com arte foi essencial para minha definição.” No fim dos anos 60, com os primeiros trabalhos, não pôde mais esconder da família que desejava viver da arte. “Na minha casa, não tinha tanto preconceito. Eles pensavam assim: ‘Como você vai sobreviver no balé? Que futuro você vai ter?’ Agora de Paracuru, sim, sofri preconceito.” Com a família a questão logo se resolveu, a irmã e atual braço direito na administração da Escola de Dança, Leda Sampaio, com quem morava em Fortaleza, foi a primeira a saber e tratou de resolver as coisas em casa. Com a cidade, a relação não se resolveu muito bem até os dias de hoje. “Me sinto um pouco estrangeiro aqui. Passei muito tempo fora, as pessoas faziam uma imagem de mim, comentavam. Agora vivo aqui, mas prefiro não ter vida social. Isso deve contribuir para que se mantenha um certo mistério quanto à minha figura.”

Flávio Sampaio nasceu para dançar. Mesmo que em Paracuru, na infância, não houvesse um professor de forró que fosse. Mesmo que a família o mandasse para o Colégio Militar, em Fortaleza. O que poderia afastá-lo do sonho foi justamente o que lhe deu a oportunidade de vivê-lo. “Passei os anos de Colégio Militar fazendo cursos de teatro, cinema e dança, escondido da família. Procurei me engajar no mundo artístico. Assisti a Hair, a montagem clássica com a Sônia Braga. Esse contato direto com arte foi essencial para minha definição.” No fim dos anos 60, com os primeiros trabalhos, não pôde mais esconder da família que desejava viver da arte. “Na minha casa, não tinha tanto preconceito. Eles pensavam assim: ‘Como você vai sobreviver no balé? Que futuro você vai ter?’ Agora de Paracuru, sim, sofri preconceito.” Com a família a questão logo se resolveu, a irmã e atual braço direito na administração da Escola de Dança, Leda Sampaio, com quem morava em Fortaleza, foi a primeira a saber e tratou de resolver as coisas em casa. Com a cidade, a relação não se resolveu muito bem até os dias de hoje. “Me sinto um pouco estrangeiro aqui. Passei muito tempo fora, as pessoas faziam uma imagem de mim, comentavam. Agora vivo aqui, mas prefiro não ter vida social. Isso deve contribuir para que se mantenha um certo mistério quanto à minha figura.”

No início dos anos 70, Flávio perseguia, sem muito êxito, seu objetivo principal, dançar balé. A chance apareceu em janeiro de 1974, num curso especial que o diretor do Municipal do Rio de Janeiro, Dennis Grey, fora convidado a dar em Fortaleza, e Flávio fazia como ouvinte. Acompanhou meses de curso incógnito, até um dia, quando chegou mais cedo, encontrou a porta do teatro aberta e o palco, lá no fundo, iluminado. Ninguém por perto, nada além de uma bela música. Subiu no palco e executou tudo que aprendera observando. O teatro, porém, não estava totalmente vazio, o próprio professor observava tudo do escuro. Grey se aproximou de um lívido e envergonhado futuro parceiro e disse apenas: “Venha amanhã que você vai aprender”.

Daí em diante sua carreira teve ascensão meteórica. Apesar de ter entrado oficialmente no curso com seis meses de atraso em relação aos colegas, Flávio terminou a formação no ano seguinte como melhor aluno da turma, sem experiência anterior em balé. O prêmio foi um mês de workshops no Municipal do Rio. No ano seguinte, trabalhou na Cia. do Teatro Guaíra, de Curitiba, até uma noite fria de sábado de 1976, em São Paulo, onde o grupo encerrava uma turnê. No fim do espetáculo, a maioria dos colegas rumou para a rodoviária e, de lá, para o Rio de Janeiro: no domingo haveria prova para o corpo de balé do Teatro Municipal. Flávio Sampaio tinha decidido não fazê-la. Apesar do rápido sucesso, era consciente de que havia começado tarde na dança, a concorrência era fortíssima, enfim, o esforço não valia a pena. Uma amiga o convenceu do contrário e ele embarcou durante a madrugada para a capital fluminense. O corpo de balé do Municipal não se renovava havia 15 anos, a quantidade de bailarinos experientes concorrendo era imensa. Entre os únicos três aprovados estavam Ana Botafogo e um cearense de Paracuru. Dos seus 12 anos de experiência como bailarino, extraiu algumas lições sobre o que não fazer em sala de aula, como professor. “Em 12 anos, fui corrigido apenas três vezes”, ele comenta sobre a pouca atenção recebida. “Havia uma separação muito clara lá dentro, entre o que chamávamos de alto e baixo clero.”

Os alunos do “professor Flávio” têm uma rotina puxada. Saem de casa às cinco da manhã para voltar só no começo da noite. Quem mora nas comunidades mais distantes chega a rodar uma hora e meia no ônibus da prefeitura, que garante o transporte das crianças de casa até a escola formal e a de dança. Ainda recebem refeição e uniforme de dança completo. O respeito que demonstram pelo espaço da Escola de Dança de Paracuru é notável. Na última seleção, em 2006, a escola recebeu 984 inscrições para 30 vagas, que acabaram virando 54. “Os talentos eram tantos que não tive como dispensar alguns”, Flávio reconhece, quase envergonhado. “Na minha primeira experiência lecionando para crianças, quase enlouqueci. Não havia tempo para corrigir todas. Um superior me aconselhou: ‘Separe os cinco melhores e demonstre que você fez seu trabalho. Esqueça o resto’. Eu não consigo separar os cinco melhores.” Flávio sabe que, ali em Paracuru, ele não pode separar os melhores. “O balé é uma atividade muito cruel. O início é penoso, com aulas no chão, o corpo vai sendo esculpido mesmo, pois nada disso que fazemos é natural. Você se esforça, sente muita dor e está sempre errado. A tradição dos mestres é não premiar muito esse esforço. Sou contra isso.”

A crueldade da própria arte ele experimentou num ensaio quando já era o terceiro bailarino do Municipal do Rio. Levantou uma colega que se desequilibrou no alto e o atirou de costas ao chão. Por lá ficou. Uma hérnia de disco gravíssima o obrigou a ficar de cama por meses, sem se mexer. Após cirurgias e muita fisioterapia, tentou um retorno, frustrado por dores incessantes. Com a impossibilidade de fazer o que mais gostava, no auge da vida profissional, Flávio resolveu arriscar: prestou a prova para mestre de balé do Municipal, algo que muitos consideravam inviável. “É coisa para os 50, 60 anos”, reconhece. Aos 39, tornou-se professor de balé clássico da melhor escola do país. Novamente, porém, entrou em confronto com a tradição. “Me disseram que os alunos não me respeitariam, por ser muito jovem. A primeira vez que lecionei balé clássico foi na Europa, em Munique, a convite de uma amiga. Depois fui para Varsóvia, um dos centros mais importantes do mundo, porque é totalmente vinculado à escola russa, a melhor.” Só depois da experiência no exterior é que Flávio Sampaio foi autorizado a dar aula no Municipal do Rio, onde trabalhou até se aposentar, em 1999.

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